Pular para o conteúdo

Por Julio Plaza

          In folheto dobrado da individual Nature,
          Capela do Morumbi, São Paulo, 1995                                   

 

Nature

         orientais escolhiam pedras fascinantes belas estranhas insólitas

         arredondadas

         que convertiam em “obras de arte”

         o oriental afirmava assim a sua IDENTIDADE com a natureza

 

         buscar pedras diferentes ou iguais

         não são atos distintos:

         ambos afirmam que a natureza é criadora

        

         escolher uma pedra entre mil

         equivale a dar-lhe nome

         guiado pelo princípio da analogia

         o homem nomeia a natureza:

         cada nome é uma metáfora

 

         uma pedra é igual a outra

         e um objeto industrial é igual a sua cópia

         se a semelhança entre pedras é natural e involuntária

         entre os objetos manufaturados é artificial e deliberada

         depende de seu significado

         a identidade entre as pedras carece de significado

 

         marcel duchamp escolhia objetos neutros indiferentes industriais

         que recolocados em novo contexto

         mediante gesto crítico-criativo

         ficavam esvaziados de significado

         são os redy-mades: neles, predomina a DIFERENÇA

        

         só por um instante:

         todas as coisas manipuladas pelo homem

         têm a fatal tendência a emitir sentido

                 

         NATURE: a poética da SEMELHANÇA

         a reciclagem da matéria prima:

         (o refugo de secreções magmáticas de plástico

         dadas de forma causal e casual)

         fortemente determinada na sua fisicalidade

         é transformada seletivamente em algo indeterminado

         e ambíguo

         pelo ato criativo

        

         dejetos (inorgânicos) transformados em objetos

         ou formas galactopoéticas

         prenhes de plasticidade tátil e visual

 

         buscar dejetos plásticos diferentes ou iguais

         não são atos distintos:

         ambos afirmam que a técnica é criadora

         pelo avesso

         pois a técnica é a natureza do homem moderno:

         nosso ambiente e horizonte

 

         essa apropriação de dejetos corpóreos de natureza técnica

         leva marta strambi a definir sua poética das SEMELHANÇAS

         por incorporação do acaso:

         nomear codificar, dar sentido, procurar a significação:

         “reimagicizar”

 

         “obra aberta” como proposição

         de um “campo” configurado de estímulos táteis e visuais

         dotado de indeterminação & ambiguidade

         e aberto às possibilidades interpretativas

 

         um olhar que age segundo a lei da semelhança

         é de importância fundamental

         para desvelar e revelar

         os significados de saberes ocultos     

         NATURE:  imagem-enigma

         (em paráfrase benjaminiana)

         a natureza e a técnica engendram semelhanças:

         as semelhanças percebidas conscientemente

         em comparação com as incontáveis semelhanças

         inconscientes

         são como a pequena ponta do ICEBERG

         visível na superfície do mar

         em comparação com a poderosa massa submarina

         estas correspondências naturais

         estimulam e despertam a faculdade mimética do homem

 

         se a leitura a partir dos astros

         das víceras e dos acasos

         era para o primitivo sinônimo de leitura em geral

         pode se supor que o dom mimético

         antes fundamento da clarividência

         emigrou gradativamente no decorrer dos milênios

         para a arte a linguagem a tecnologia

         nelas produzindo um arquivo de semelhanças

         e qualidades extras-sensíveis.

 

         NATURE:  imagem-miragem

         mas o momento do nascimento da SEMELHANÇA

         que é decisivo

         é apenas um instante

         a sua percepção dá-se num relampejar

        

         a semelhança se oferece ao olhar

         de modo tão efêmero e transitório

         como uma constelação de astros

         as semelhanças irrompem do fluxo das coisas

         param o tempo

         transitoriamente

         para desaparecem em seguida